Entrevista a Filipe Moura sobre a expansão da rede do Metro de Lisboa e sobre os possíveis efeitos da restrição do tráfego na Baixa.
O professor e investigador na área da Mobilidade e Transportes do Instituto Superior Técnico (IST) critica a atuação da Assembleia da República quanto ao Metro de Lisboa. E lembra quais as “cautelas” que a autarquia da capital deverá ter em relação ao plano de fechar o trânsito na Baixa-Chiado
O Parlamento suspendeu, esta semana, os concursos para a obra da linha circular do metro de Lisboa e sugeriu estudar a expansão para Alcântara e Loures. “É errado exercerem esse poder”, critica Filipe Moura, professor na área de Mobilidade do Instituto Superior Técnico (IST). Já no plano de cortar o trânsito na Baixa, anunciado pela Câmara Municipal de Lisboa (CML), o especialista vê “um modelo a replicar”. Não teme um efeito negativo no comércio, mas alerta para os cuidados a ter.
O que é que favoreceria mais a mobilidade do metro?
O metro não tem vocação intermunicipal. É um modo de transporte que se quer rápido e para distâncias curtas. Levar o metro para fora de Lisboa é correr o risco de as pessoas demorarem mais tempo até ao destino e perder-se competitividade. Se for melhor ir de carro do que de metro, as pessoas vão de carro. Acho que faz muito mais sentido prolongar a Linha Vermelha até Alcântara, promovendo até a interligação com a linha de Cascais e talvez transformar-se num metro de superfície até Belém. Ir para a Ajuda é claramente uma prioridade, porque é uma zona com muita população, sem comboio nem metro. Agora, o que não deve acontecer é o Parlamento substituir-se às instituições de planeamento de transportes. Acho legítimo que discuta a alocação de verbas para um investimento tão grande. Mas nesse caso também deve assumir que, ao não fazer este projeto, está a ter um custo, pois já não vai poder ir buscar esse dinheiro [aos fundos comunitários]. Ilegítimo é o Parlamento dizer que se deve estudar a expansão para Loures ou para outro sítio, porque não lhe compete fazer esse planeamento. Não são Governo, IMT [Instituto da Mobilidade e dos Transportes] ou Metropolitano.
A propósito das alterações à mobilidade no centro de Lisboa e ao eventual efeito negativo no comércio local refere – “Seria muito estranho. Nunca aconteceu nos sítios com alterações semelhantes. Na Times Square, New York City, ou na Trafagal Square, em Londres, parecia impensável fechar o trânsito, mas foi feito e o comércio disparou. Em Lisboa, o que poderá ter algum risco é a escala, porque é uma área de intervenção muito grande. E é preciso ter algumas cautelas. Quando se fecha uma zona de tráfego, acontece um de três efeitos: ou os carros apenas atravessavam a zona e mudam as suas rotas, ou tinham esta zona como destino e transferem-se do automóvel para o transporte coletivo, ou as atividades que iam fazer nesse local passam a ser realizadas noutro sítio. Este último efeito é o que pode ter impacto no comércio local, mas a própria transformação do espaço atrairá pessoas que não o usavam. Neste plano, só acho contraditório aceitarem a entrada de pessoas com veículos elétricos. Faz muito mais sentido promoverem a eletrificação dos transportes públicos, táxis e, progressivamente, Uber.”
Texto de Raquel Albuquerque
Publicado em https://expresso.pt/sociedade/2020-02-08-Filipe-Moura-Nao-compete-ao-Parlamento-planear-transportes a 8 Fev 2020